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Robert Kinney
Suplicai, ao mesmo tempo, também por nós, para que Deus nos abra porta à palavra, a fim de falarmos do mistério de Cristo, pelo qual também estou algemado; para que eu o manifeste claramente, como devo fazer. (Colossenses 4.3-4)
No que diz respeito ao seu modo de proclamar a palavra – ou o que os retóricos chamavam estilo na oratória –, parece que clareza era algo prioritário para Paulo.[1] E, quer ele pretendesse ou não que aquela frase fosse prescritiva para a nossa pregação, há algo a se aprender aqui.[2]
É algo que eu preciso aprender. Certamente, clareza é uma das coisas pelas quais mais tenho lutado na minha própria pregação. Mas também me parece ser algo que muitos pregadores consideram desafiador. Clareza é difícil. E é difícil por muitas razões. Contudo, um aspecto chave da pregação, do qual a clareza geralmente depende, é a articulação de uma única ideia ou proposição principal. É claro que a pregação expositiva nem sempre precisa ser proposicional num sentido técnico. Todavia, a exposição sempre tentará localizar e comunicar o cerne da passagem bíblica.
É isso que você está tentando fazer em sua preparação para o sermão, a cada semana?
Ou será que a sua pregação não tem um ponto central?[3]
Uma preocupação prática com a clareza
Há uma séria falta de clareza resultante de não se apresentar a ideia mais ampla, o ponto central. E essa falta de clareza é comum. Essa pregação sem ponto central pode ser o resultado da influência da assim chamada Nova Homilética, ou do aparente sucesso de muitos pregadores com a pregação narrativa, ou do desejo dos pregadores de serem criativos ou de criarem suspense em seus sermões, ou de um desejo muito mais rasteiro de simplesmente entreter, ou da capacidade cada vez menor de concentração do nosso povo, ou de uma variedade de outras influências.
É fácil deter-se numa boa história ou querer enfatizar a emoção de um texto ou a beleza de algum elemento secundário. Quaisquer que sejam as causas, alguns de nós parecem ter aderido a um tipo de pregação que deixa de lado o estabelecimento de uma ideia principal, seja dedutiva ou indutivamente. Muitas vezes, não há nenhuma coerência de pensamento que permita identificar um ponto central único e memorável. E, tristemente, nosso povo muitas vezes vai embora sem nenhuma ideia do que deveria ter aprendido.
É compreensível, em nossa era pós-moderna de abordagens voltadas para a reação do leitor e de compromissos inabaláveis com a auto-realização, que o sermão tenha se tornado um bufê de pensamentos da mente do pregador (três ou quatro observações sobre o texto, talvez uma ou duas tangentes, poucas aplicações vagamente relacionadas, algumas boas histórias ou citações, talvez uma referência à ilustração de abertura para envelopar tudo), no qual a congregação simplesmente põe no prato o que lhe parece bom e se alimenta daquilo.
Enquanto pregadores, nós pensamos que construir apenas um argumento único e então defendê-lo a partir do texto parece excessivamente rudimentar, formulaico ou, talvez, até mesmo legalista. Então, nós tentamos evitar dizer ao nosso povo o que pensamos ser o ponto central do texto. Evitamos estruturar nossos sermões como uma demonstração composta de várias partes. Evitamos o foco de uma ênfase única, porque temos medo de que estejamos errados, o que acidentalmente mostraria que não sabemos de tudo. Ou, o que é pior, temos medo de que a nossa pregação se pareça demais com uma pregação.
E, embora haja algum valor em evitar o formulaico (já que nosso povo sem dúvida acharia cansativo ter a mesma estrutura toda semana), essa abordagem aleatória e sem ponto central da pregação pode estar fazendo um desserviço ao nosso povo. Quando somos ocupados (ou preguiçosos?) demais para chegarmos a um ponto único, ou quando tentamos escondê-lo em retórica, ou quando falhamos em estabelecer uma estrutura clara para o nosso sermão, nosso povo – cansado, ocupado e distraído como é –, quase sempre irá perder o ponto central. Ou, o que é mais provável, eles podem simplesmente perceber que, na verdade, somos nós que não tínhamos um ponto principal.
Clareza: unidade e ponto central
A clareza que provém de formular um argumento bem fundamentado, culminando em uma proposição única, é uma característica chave da retórica antiga.[4] Essa premissa foi capturada nas preleções de Robert Lewis Dabney sobre A Retórica Sacra, publicadas no final do século XIX, as quais oferecem meditações sobre a relação entre a oratória antiga e a pregação. De modo relevante, dois dos sete requisitos cardinais do sermão apontados por Dabney enfatizam essa ideia de apresentar um ponto central único.
Primeiro, embora cuidadosamente rejeite o reducionismo, ele sugere que a unidade do sermão (seu segundo requisito) resulta da combinação de todas as suas diferentes partes, que conduz a uma impressão geral para o ouvinte. Assim, o pregador deve “ter um assunto principal de discussão, ao qual ele adere com supremo respeito do começo ao fim”, bem como deve apresentar “uma impressão definida à alma do ouvinte, para a qual tudo no sermão converge”.[5]
Essa segunda exigência, a apresentação de “uma impressão definida”, parece ser expandida no sexto requisito de Dabney: um ponto central. “Com esse fim, deve haver, primeiro, uma verdade principal, prática e importante, distintamente capturada pelo pregador em sua relação com a ação da alma que ele deve estimular. E toda a questão do discurso deve se organizar de tal modo a pôr em destaque essa proposição”.[6] Dabney conjectura que sermões deficientes em um ponto central ou não contêm em si Verdades valiosas, ou essas Verdades “não são colocadas de modo a se sobressaírem à compreensão dos ouvintes”.[7]
O que fazer? Cinco sugestões para encontrar clareza
Se você também luta com a questão da clareza, há algumas coisas práticas a serem consideradas enquanto você prepara o sermão:
1. Tenha um ponto central
Pregação expositiva não é simplesmente um comentário sobre o texto. É a transmissão da Verdade do texto.[8] Como tal, é muito importante que você chegue, em sua própria mente, a uma proposição clara e curta que expresse a ideia geral do seu sermão (a qual, é claro, será derivada da ideia geral do texto) e, então, de fato, apresente essa proposição em algum momento do sermão. Como Bryan Chapell observa tão claramente em seu livro Pregação Cristocêntrica: “Os ouvintes rapidamente se cansam de caçar ideias e anedotas pela paisagem teológica no esforço de descobrirem aonde o seu pastor está indo”.[9]
2. Mostre como o ponto central está fundamentado no texto
Boa exegese e boa reflexão teológica lhe revelarão uma clara ênfase no texto. Se você tiver trabalhado duro, isso lhe dará a ideia geral para o seu sermão. Mas você deve mostrá-la claramente no texto. É claro que você deseja que o seu povo confie em você, mas, mais do que isso, você deseja que tenham confiança na Verdade daquilo que você está dizendo a partir da Palavra de Deus. Você não precisa ser um guru ou um mágico expositivo. Os melhores sermões são aqueles em que as pessoas sentem que você simplesmente lhes apontou o que está no texto e deixou que ele fizesse efeito em seus corações e mentes.
3. Contenha-se: edite para alcançar clareza
Não tenha medo de “aparar” o seu trabalho com liberalidade. Uma das maneiras mais rápidas de dar clareza ao seu tema central é cortar fora de sua apresentação tudo o que não sirva para apoiá-lo. Isso pode ser muito difícil se você tiver se dedicado bastante em sua exegese. Você terá aprendido bastante sobre o seu texto durante a última semana e ficado bem eloquente em questões secundárias. Não obstante, se você fez o trabalho de restringir-se a uma ideia principal, não confunda nem distraia as pessoas com outras coisas, não importa quão curiosas lhe pareçam.
4. Contenha-se: edite para alcançar simplicidade
Não leve seu povo em um caça-tesouros exegético. O instinto de apontar seu povo para o texto e desfrutar daquele momento em que todos voltam sua atenção para as Escrituras é bom. Contudo, mais não é sempre melhor. Os editores de nossas Bíblias nos deram milhares de referencias cruzadas. O seu povo não precisar vê-las todas. Não confunda uma multidão de conexões com algo que pode dar um apoio real para seu argumento. Se há um texto chave, claro, leve a igreja até lá. Porém, é mais que provável que haja somente uma ou talvez duas passagens assim em um sermão. Abra mais passagens que isso e você possivelmente estará na esfera da teologia bíblica (o que pode ser útil), porém isso poderá custar o ponto principal da sua passagem.
5. Contenha-se: edite para alcançar vigor
Pregue sermões mais curtos. Poucos são pregadores de 50 minutos. Ainda menos são pregadores de 60 minutos. Eu provavelmente nunca o conheci, mas me sinto relativamente confiante (pelo menos estatisticamente) em dizer que a duração média do seu sermão é, provavelmente, um pouco maior do que deveria ser. E, mesmo que eu esteja errado, estou bastante confiante em dizer que a duração média do seu sermão é maior do que a sua congregação gostaria que fosse. Leva tempo, destreza e uma incrível autodisciplina para edificar uma congregação que aprecie um discurso longo e bem articulado. Se você não herdou uma congregação assim nem dedicou anos (na verdade, décadas) para desenvolver uma, considere encurtar o seu sermão. No mínimo, o ato de encurtar seu sermão irá forçá-lo a uma maior clareza e, idealmente, a apresentar de modo simples e sucinto a sua ideia geral.
Notas:
[1] “Com respeito ao estilo, um dos seus principais méritos pode ser definido como perspicuidade. Isso se mostra no fato de que o discurso, se não tem o seu significado aclarado, não irá cumprir a função que lhe é própria”. Aristóteles, Retórica 1404b (LCL, Freese). Quando os retóricos antigos consideravam a clareza, ou perspicuidade, eles parecem estar primariamente focados na escolha das palavras e em se elas causariam confusão à audiência. Ver também Quintiliano, Institutio Oratoria 8.1.1-7. Isso poderia muito bem ser o que Paulo tinha em vista em 1 Coríntios 1.17: “Porque não me enviou Cristo para batizar, mas para pregar o evangelho; não com sabedoria de palavra, para que se não anule a cruz de Cristo”. Para Cícero, a clareza também se estende à organização do material em favor de um argumento primário. “Uma organização dos assuntos a serem mencionados em um argumento, quando feita de modo adequado, torna toda a oração clara e inteligível”. Ver Cícero, De Inventione 1.22. Essa tradução vem de Cicero, The Orations of Marcus Tullius Cicero, Volume 4 (trans. C.D. Yonge; London: G. Bell & Sons, 1913), 241-306.
[2] Embora muito do argumento deste artigo não possa ser precisamente defendido como uma prescrição do Novo Testamento, é digno de nota que muito do que eu sugerirei sobre a clareza e a apresentação de um ponto central único e identificável, com uma clara estrutura retórica, é observável na pregação dos apóstolos em Atos e na “pregação” escrita de Paulo em suas epístolas.
[3] N.T.: O autor joga com a palavra inglesa pointless, que comumente significa “sem sentido”, mas, literalmente, significa “sem ponto”. A pregação sem ponto central (pointless preaching) não é necessariamente sem sentido, embora possa padecer da falta da clareza a qual alude o autor.
[4] Seria fácil começar com Aristóteles no século IV a.C. e a sua definição de retórica como “os meios reais e aparentes de persuasão” – Aristóteles, Retórica 1.1.14 (LCL, Freese). Poderíamos considerar os manuais de retórica de Cícero e Quintiliano, os quais parecem se fundamentar na presunção de que oratória é persuasão. Sendo assim, se assumirmos essa premissa básica da retórica para a nossa pregação, então o trabalho do pregador – de fato, a sua responsabilidade – é persuadir. A clareza que conduz à persuasão, por exemplo, exige um tipo particular de estrutura discursiva. E a estrutura básica da oratória sempre inclui a afirmação de uma proposição principal única, no princípio. Ver Cícero, Rhetorica ad Herennium 1.8.11-1.9.16 e Quintiliano, Institutio Oratoria 4.4. A estrutura da oratória também inclui, tipicamente, uma reafirmação do ponto principal como uma peroração ao final. Ver Cícero, De Inventione 1.52-56. “Que prazer pode um orador esperar produzir, ou que impressão até do mais moderado aprendizado, a menos que ele saiba como fixar um único ponto nas mentes da audiência pela repetição e outro, pela ênfase, como fazer uma digressão e retornar ao seu tema, como desviar a culpa de si mesmo e transferi-la a outro, ou decidir quais pontos omitir e quais ignorar como insignificantes? São qualidades como essas que dão vida e vigor à oratória; sem elas, ela jaz entorpecida como um corpo que carece de fôlego para mover seus membros” – Quintiliano, Institutio Oratoria 9.2.4 (LCL, Butler).
[5] Robert Lewis Dabney, Sacred Rhetoric (New York: Anson D.F. Randolph & Co., 1870), 109. Here, Dabney cites Cicero, De or. 2.114.
[6] Robert Lewis Dabney, Sacred Rhetoric (New York: Anson D.F. Randolph & Co., 1870), 126.
[7] Robert Lewis Dabney, Sacred Rhetoric (New York: Anson D.F. Randolph & Co., 1870), 127.
[8] Considere, por exemplo, as definições de pregação expositiva oferecidas por Mark Dever (“um sermão que toma o ponto central do texto como o ponto central do sermão”) ou Mike Bullmore (“pregação na qual o conteúdo e o propósito da passagem moldam o conteúdo e o propósito da mensagem”). Exposição, assim, não é simplesmente o conteúdo ou o tema central do texto (extraído pela exegese e reflexão teológica). Exposição também exige a simplicidade e a clareza de apresentar o ponto central do texto.
[9] Bryan Chapell, Christ-Centered Preaching, Second Edition (Grand Rapids: Baker Academic, 1994), 44 (Publicado em português com o título Pregação Cristocêntrica (Editora Cultura Cristã, 2002).
Tradução: Vinícius Silva Pimentel
Revisão: Vinícius Musselman Pimentel
Revisão: Vinícius Musselman Pimentel
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