Alderi Souza de Matos
Historicamente, muitos grupos e líderes evangélicos têm enfrentado sérios problemas na sensível área das finanças. No Brasil, um caso relativamente recente envolveu o casal Hernandes, os fundadores da Igreja Renascer em Cristo.
Não é sem razão que o dinheiro e seu uso estão entre os temas mais freqüentes da Bíblia. Na maior parte dos textos que falam do assunto, o tom é de solene advertência quanto aos perigos que espreitam nessa área (ver 1Tm 6.9-10). Existem alguns elementos no ambiente cultural evangélico e pentecostal que contribuem para esses problemas.
Personalismo
Os reformadores protestantes do século 16 contestaram um sistema religioso cujos líderes eram tidos como detentores de um poder espiritual especial. Eles insistiram no princípio bíblico de que os crentes são sacerdotes de Deus (1Pe 2.5,9; Ap 1.6) e, portanto, iguais diante dele. Sem desmerecer a figura dos ministros cristãos, eles os qualificaram como instrumentos escolhidos por Deus através dos fiéis, não tendo qualquer status espiritual superior. Todavia, com o passar dos anos muitas igrejas herdeiras da Reforma têm ficado fascinadas com o antigo sacerdotalismo questionado pelos reformadores.
A tendência de colocar os líderes eclesiásticos em um pedestal, considerando-os “ungidos do Senhor” e, portanto, intocáveis, imunes a contestações e críticas, tem sido motivo de inúmeros males para a causa de Cristo. Muitos líderes evangélicos contribuem para esse nefasto culto da personalidade quando alegam possuir virtudes e dons especiais, atribuem a si mesmos títulos grandiosos e condicionam os seus liderados a obedecê-los cegamente, desprezando exortações bíblicas claras como 1Pedro 5.1-4.
Triunfalismo
Durante a maior parte da Idade Média, a cristandade européia foi afligida por uma série de distorções, uma das quais recebeu o nome de “simonia”, a comercialização de bens religiosos, em especial a compra e venda de cargos eclesiásticos. Os mais cobiçados eram os mais lucrativos, como a chefia dos bispados e dos grandes mosteiros. Esse vício floresceu graças à mentalidade triunfal de uma instituição que detinha a hegemonia do campo religioso e era extremamente rica e poderosa.
A atitude triunfalista é cultivada nas igrejas evangélicas sempre que os líderes e os membros se consideram tão próximos de Deus, tão abençoados e protegidos por ele, que nada poderá atingi-los. O problema dessa atitude, além da falta de humildade, é a tendência de minimizar os pecados dos crentes, especialmente dos líderes, e de considerar as críticas e reveses que sofrem por causa dos seus erros como provações passageiras ou ataques do inimigo. Com isso, os problemas não são admitidos, tratados e solucionados de maneira bíblica e cristã.
Falta de prestação de contas
O final dos anos 80 foi péssimo para a imagem dos evangélicos nos Estados Unidos. Diversos escândalos vieram a público, a maior parte na área financeira, envolvendo “tele-evangelistas” como Oral Roberts e Jim Bakker. Este último, após ser denunciado pela secretária com quem teve um caso, foi investigado pelo governo e condenado à prisão por evasão fiscal e malversação das contribuições dos fiéis. Em resposta a esses episódios, foi criada uma organização chamada Conselho Evangélico pela Responsabilidade Financeira, que examina as contas dos ministérios que desejam um atestado de boa conduta.
É importante reconhecer que a maior parte das igrejas evangélicas realiza o seu trabalho cristão com seriedade e integridade. No entanto, as práticas financeiras de muitas igrejas e ministérios são uma incógnita. Com freqüência são os próprios obreiros e pastores que recolhem e administram as contribuições. Não há tesoureiros eleitos, relatórios periódicos publicados, comissões de exame de contas. Os fiéis têm pouca ou nenhuma participação nessa área tão importante. Nesse ambiente de falta de transparência e de ausência de prestação de contas, tudo pode acontecer.
Teologia distorcida
Talvez a causa mais básica dos problemas que têm ocorrido seja uma interpretação bíblica tendenciosa e uma teologia falha, que surgiu há várias décadas na América do Norte e chegou ao Brasil como o “evangelho da prosperidade”. O fundamento dessa ideologia afirma que a obra redentora de Cristo conquistou para os crentes a vitória sobre todos os tipos de males, resultando em salvação, saúde física e sucesso financeiro. Argumenta-se que os “filhos do Rei” devem, por definição, ser prósperos em tudo.
Ao mesmo tempo, são convenientemente esquecidos os muitos textos bíblicos que apontam na direção oposta, condenando a preocupação com os bens materiais, alertando para a armadilha espiritual representada pela ganância, bem como destacando o exemplo de Cristo e o discipulado cristão humilde e altruísta. Com a pragmática teologia da prosperidade, muitas igrejas enchem seus templos e seus cofres, mas oferecem pouca nutrição aos seus fiéis e uma mensagem alienante em relação aos problemas que assolam o país. Por trás do discurso piedoso, essas igrejas tornam-se cada vez mais parecidas com o mundo.
Conclusão
O Brasil vive um dos piores períodos da sua história. Apesar da relativa estabilidade econômica, o crime e a insegurança atingem níveis sem precedentes; as instituições públicas estão com sua imagem destroçada; o sentimento predominante é de cinismo, indiferença e perda do idealismo.
Nesse ambiente desolador, as igrejas evangélicas e seus líderes podem mostrar que há esperança nos valores e princípios apregoados pela fé cristã. Todavia, em primeiro lugar é necessário que pratiquem os valores bíblicos em sua própria casa, vivendo de modo digno do evangelho de Cristo (Fp 1.27). Só assim terão autoridade espiritual, moral e ética para serem instrumentos de transformação.
FONTE: http://www.institutojetro.comNão é sem razão que o dinheiro e seu uso estão entre os temas mais freqüentes da Bíblia. Na maior parte dos textos que falam do assunto, o tom é de solene advertência quanto aos perigos que espreitam nessa área (ver 1Tm 6.9-10). Existem alguns elementos no ambiente cultural evangélico e pentecostal que contribuem para esses problemas.
Personalismo
Os reformadores protestantes do século 16 contestaram um sistema religioso cujos líderes eram tidos como detentores de um poder espiritual especial. Eles insistiram no princípio bíblico de que os crentes são sacerdotes de Deus (1Pe 2.5,9; Ap 1.6) e, portanto, iguais diante dele. Sem desmerecer a figura dos ministros cristãos, eles os qualificaram como instrumentos escolhidos por Deus através dos fiéis, não tendo qualquer status espiritual superior. Todavia, com o passar dos anos muitas igrejas herdeiras da Reforma têm ficado fascinadas com o antigo sacerdotalismo questionado pelos reformadores.
A tendência de colocar os líderes eclesiásticos em um pedestal, considerando-os “ungidos do Senhor” e, portanto, intocáveis, imunes a contestações e críticas, tem sido motivo de inúmeros males para a causa de Cristo. Muitos líderes evangélicos contribuem para esse nefasto culto da personalidade quando alegam possuir virtudes e dons especiais, atribuem a si mesmos títulos grandiosos e condicionam os seus liderados a obedecê-los cegamente, desprezando exortações bíblicas claras como 1Pedro 5.1-4.
Triunfalismo
Durante a maior parte da Idade Média, a cristandade européia foi afligida por uma série de distorções, uma das quais recebeu o nome de “simonia”, a comercialização de bens religiosos, em especial a compra e venda de cargos eclesiásticos. Os mais cobiçados eram os mais lucrativos, como a chefia dos bispados e dos grandes mosteiros. Esse vício floresceu graças à mentalidade triunfal de uma instituição que detinha a hegemonia do campo religioso e era extremamente rica e poderosa.
A atitude triunfalista é cultivada nas igrejas evangélicas sempre que os líderes e os membros se consideram tão próximos de Deus, tão abençoados e protegidos por ele, que nada poderá atingi-los. O problema dessa atitude, além da falta de humildade, é a tendência de minimizar os pecados dos crentes, especialmente dos líderes, e de considerar as críticas e reveses que sofrem por causa dos seus erros como provações passageiras ou ataques do inimigo. Com isso, os problemas não são admitidos, tratados e solucionados de maneira bíblica e cristã.
Falta de prestação de contas
O final dos anos 80 foi péssimo para a imagem dos evangélicos nos Estados Unidos. Diversos escândalos vieram a público, a maior parte na área financeira, envolvendo “tele-evangelistas” como Oral Roberts e Jim Bakker. Este último, após ser denunciado pela secretária com quem teve um caso, foi investigado pelo governo e condenado à prisão por evasão fiscal e malversação das contribuições dos fiéis. Em resposta a esses episódios, foi criada uma organização chamada Conselho Evangélico pela Responsabilidade Financeira, que examina as contas dos ministérios que desejam um atestado de boa conduta.
É importante reconhecer que a maior parte das igrejas evangélicas realiza o seu trabalho cristão com seriedade e integridade. No entanto, as práticas financeiras de muitas igrejas e ministérios são uma incógnita. Com freqüência são os próprios obreiros e pastores que recolhem e administram as contribuições. Não há tesoureiros eleitos, relatórios periódicos publicados, comissões de exame de contas. Os fiéis têm pouca ou nenhuma participação nessa área tão importante. Nesse ambiente de falta de transparência e de ausência de prestação de contas, tudo pode acontecer.
Teologia distorcida
Talvez a causa mais básica dos problemas que têm ocorrido seja uma interpretação bíblica tendenciosa e uma teologia falha, que surgiu há várias décadas na América do Norte e chegou ao Brasil como o “evangelho da prosperidade”. O fundamento dessa ideologia afirma que a obra redentora de Cristo conquistou para os crentes a vitória sobre todos os tipos de males, resultando em salvação, saúde física e sucesso financeiro. Argumenta-se que os “filhos do Rei” devem, por definição, ser prósperos em tudo.
Ao mesmo tempo, são convenientemente esquecidos os muitos textos bíblicos que apontam na direção oposta, condenando a preocupação com os bens materiais, alertando para a armadilha espiritual representada pela ganância, bem como destacando o exemplo de Cristo e o discipulado cristão humilde e altruísta. Com a pragmática teologia da prosperidade, muitas igrejas enchem seus templos e seus cofres, mas oferecem pouca nutrição aos seus fiéis e uma mensagem alienante em relação aos problemas que assolam o país. Por trás do discurso piedoso, essas igrejas tornam-se cada vez mais parecidas com o mundo.
Conclusão
O Brasil vive um dos piores períodos da sua história. Apesar da relativa estabilidade econômica, o crime e a insegurança atingem níveis sem precedentes; as instituições públicas estão com sua imagem destroçada; o sentimento predominante é de cinismo, indiferença e perda do idealismo.
Nesse ambiente desolador, as igrejas evangélicas e seus líderes podem mostrar que há esperança nos valores e princípios apregoados pela fé cristã. Todavia, em primeiro lugar é necessário que pratiquem os valores bíblicos em sua própria casa, vivendo de modo digno do evangelho de Cristo (Fp 1.27). Só assim terão autoridade espiritual, moral e ética para serem instrumentos de transformação.
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